domingo, 6 de abril de 2008

venda de automóveis ''Não se pode gastar o que não se tem''

''Não se pode gastar o que não se tem''O bilionário mexicano chega ao Brasil e revoluciona o mercado de crédito no varejo com prestações semanaisO bilionário mexicano Ricardo Salinas, 51 anos, ganha a vida vendendo produtos de consumo e serviços financeiros aos clientes de baixa renda. Sua família, dona do Banco Azteca e das lojas Elektra, está nesse ramo há 100 anos e fatura US$ 5 bilhões [R$ 8,5 bilhões] por ano. Mas só agora, depois de uma espera de três anos, o Grupo Salinas conseguiu abrir sua primeira agência bancária no País, um dos mercados populares mais cobiçados da América Latina. O empresário teve de apelar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para acelerar o processo de autorização no Banco Central. O pleito chegou a Lula por meio do ex-ministro Antônio Delfim Netto. A história foi contada pelo próprio Lula, no Recife, na abertura do Fórum Brasil–México, no final de março. Ele quase cometeu uma gafe ao relatar a demora do seu governo em permitir a entrada do primeiro banco que não cobra tarifas e que tem como carro-chefe empréstimos populares e crediários com juros bem mais baixos que os da concorrência. “Nunca comprei nada à prestação na minha vida”, afirmou, para depois emendar: “Mas é que não tinha o Banco Azteca.” O dono do banco concorda com o princípio do presidente de que “não se deve gastar mais do que se ganha nem se endividar mais do que se pode pagar” – mas com uma ressalva: o conselho deve valer para o próprio governo. “É por isso que os juros estão tão altos. O governo pede muito emprestado e paga muito pelo dinheiro”, afirmou, em entrevista à ISTOÉ.ISTOÉ – O que o sr. achou da recepção popular ao presidente Lula na inauguração da loja e do banco no Recife? Ricardo Salinas – É impressionante, que barbaridade! O calor do povo ao recebê-lo é uma coisa única. Nunca vi nenhum presidente ser recebido desta maneira. ISTOÉ – Essa popularidade do presidente irá trazer benefícios ao Grupo Elektra e ao Banco Azteca? Salinas – Não creio. Nós temos que satisfazer os clientes com bons serviços, bons produtos e bons preços. É isso que nos fará populares.ISTOÉ – Como avalia a evolução da economia brasileira nos últimos anos? Salinas – Muito boa. ISTOÉ – O futuro está garantido ou o preocupa? Salinas – O futuro nunca está garantido. É preciso trabalhar. O que o presidente Lula disse no Fórum Brasil–México é muito relevante. Não se pode gastar o que não se tem. E, lamentavelmente, há uma inércia muito grande do País em pedir emprestado. Tem sido assim em todos os governos. É por isso que os juros são tão altos. O governo pede muito emprestado e paga muito pelo dinheiro. Se o governo se financia a 11%, os demais têm de pagar mais.ISTOÉ – Os consumidores também gastam o dinheiro que não têm em suas lojas. Não há uma contradição aí? Salinas – Uma coisa é quando você gasta seu dinheiro. Outra é quando o governo gasta o dinheiro de todos. É muito diferente, não? Você tem uma responsabilidade e assume as suas dívidas. E quem assume as dívidas do governo? Todos.ISTOÉ – Por que seu grupo fez a opção pelos clientes pobres? Salinas – Não gosto de chamá-los de pobres, soa muito feio. É melhor chamar de classe popular. Para nós, é uma questão histórica. Nossa família tem feito isso há muitos anos. Seguimos a inércia e tem dado certo. Há muitas maneiras de fazer negócios. Você pode vender aos ricos, aos pobres, à classe média, aos estrangeiros. Nós escolhemos esse caminho. 'O calor do povo com o Lula é uma coisa única. Nunca vi nenhum presidente ser recebido desta maneira' ISTOÉ – Por que o sr. escolheu o Nordeste? Quantas lojas irá abrir e quanto irá investir? Salinas – Escolhemos o Nordeste por causa da população, que reflete melhor o foco do Banco Azteca e do Grupo Elektra. Esperamos abrir 10 a 12 lojas durante o primeiro ano de operação. No longo prazo, poderemos chegar a duas mil lojas. No primeiro ano, estimamos investir US$ 25 milhões. Num horizonte de muitos anos, a cifra pode chegar a US$ 1 bilhão.ISTOÉ – Seu grupo evita o confronto direto com a Casas Bahia, que não tem uma só loja no Nordeste. É uma estratégia consciente? Salinas – O Nordeste oferece as melhores oportunidades para nós. A Casas Bahia faz um bom trabalho e nós também. Lembre-se: “O sol brilha para todos nós.” ISTOÉ – O sr. conhece seus concorrentes locais no País? Salinas – Todos aqueles que vendem móveis, eletrodomésticos e serviços financeiros são nossos competidores em potencial.ISTOÉ – O que a Elektra irá oferecer que os concorrentes locais não irão? Salinas – Iremos oferecer a mesma história de solidez financeira, serviços de consumo e produtos desenhados para satisfazer suas necessidades. Foi isso que tornou o Banco Azteca e o Grupo Elektra um sucesso no México, na Guatemala, no Peru, em Honduras e no Panamá. É isso que está incentivando o crescimento do Elektra em El Salvador e na Argentina. Nós temos uma fórmula bem-sucedida em vários países e não vejo por que será diferente no Brasil. ISTOÉ – A concorrência não é diferente? Salinas – Sempre há concorrência e sempre conseguimos enfrentála e sair na frente. A nossa forma de trabalhar é melhor, por vários motivos. Temos uma plataforma tecnológica muito avançada, que nos permite operar rápido, com baixo custo, sem erros e com controles administrativos muito bons. Com a fortaleza financeira do grupo, temos uma das melhores taxas de juros.ISTOÉ – Qual é a taxa de juros de sua loja no Recife? Salinas – Nessa loja, temos uma taxa de financiamento a prazo de 100% ao ano. É muito alto, não é? Mas a concorrência cobra 110%, 120% ao ano. E, se o nosso cliente pagar pontualmente, reduzimos a taxa de 100% para 80%. Este é o verdadeiro benefício que damos ao povo. Se você paga em dia, damos a melhor taxa do mercado. ISTOÉ – Existe prestação mínima?Salinas – Não. Pode ser R$ 7 por semana, R$ 10. Aqui, financiamos por até 52 semanas, você escolhe o prazo que quiser. Lá fora, temos prazo de seis semanas a 65 semanas. Se você tomar um crédito conosco, pode pagar antecipadamente em qualquer momento que bonificamos os juros em 100%. Paga somente o que usou. Em muitos lugares, o cliente tem que continuar pagando até o fim.ISTOÉ – Qual será sua principal promoção no Brasil? Salinas – O pagamento pontual e semanal. É um benefício muito grande para quem paga em dia. A cada semana, teremos ofertas diferentes. Móveis, eletrônicos, linha branca. ISTOÉ – Alguns especialistas criticam o momento que o sr. escolheu para investir no mercado brasileiro. A expansão do crédito está em seu terceiro ano e a explosão do consumo de eletrodomésticos já aconteceu. Por que vir só agora? Salinas – Temos muita confiança no futuro do Brasil como uma das economias líderes no mundo. Faz tempo que estamos interessados nesse mercado e só recentemente obtivemos autorização [do Banco Central] para iniciarmos nossa operação bancária. Uma de nossas forças nos últimos 100 anos de negócios é identificar as necessidades dos nossos clientes e responder rapidamente com produtos que os satisfazem. Nosso foco não é o curto prazo.ISTOÉ – Quais serão os próximos passos do Grupo Salinas no Brasil? Salinas – Temos uma forte história de sucesso em soluções de transporte para a classe trabalhadora. Temos uma fábrica de automóveis que gostaríamos muito de trazer para o Brasil. Nossa marca é a FAW [First Auto Works], chinesa. Fazemos subcompactos de baixo custo no México e esperamos vendê-los nos países onde há lojas Elektra e agências do Banco Azteca. Também temos uma fábrica de motocicletas, a Italika, com 40% do mercado mexicano. Nosso foco imediato é consolidar o varejo e o banco, mas estamos abertos a uma variedade grande de investimentos no Brasil, inclusive nas áreas de TV e de telecomunicações. A TV Azteca está fazendo um intercâmbio de programação e de conhecimento com a Record. ISTOÉ – O sr. irá fabricar e vender carros e motocicletas no Brasil? Salinas – É uma opção que estamos analisando.ISTOÉ – O Banco Azteca vai fazer empréstimos ou financiar somente as vendas nas suas lojas? Salinas – Sim, faremos empréstimos pessoais até R$ 5,5 mil, por até um ano e meio. Nossos clientes poderão usar o dinheiro para construir, cuidar da saúde, abrir um pequeno negócio. Nossa tecnologia é digital. Não tem carnê de papel, nada. O cartão de crédito tem um chip com toda informação do cliente. Se ele não quiser carregar nada, basta ir até a loja e colocar seu dedo no leitor digital. O reconhecimento é imediato. 'A Casas Bahia faz um bom trabalho e nós também. Damos desconto nos juros para quem paga em dia' ISTOÉ – Por que o Banco Central levou três anos para aprovar a entrada do Banco Azteca no Brasil? Salinas – Isso você vai ter que perguntar a eles.ISTOÉ – A chegada do Banco Azteca acontece numa época em que o mercado de crédito está muito competitivo. Por que um cliente iria escolher o seu banco em vez dos outros? Salinas – Há muitos bancos em todos os países onde operamos. Entretanto, há poucos especializados no mercado de renda baixa e média. É um grupo de consumidores que conhecemos muito bem. Vamos repetir nossa estratégia de sucesso em mercados como México, Guatemala, Peru, Honduras e Panamá, e adaptá-la ao clima local. ISTOÉ – Quando o sr. pretende investir no Sudeste, o maior mercado brasileiro, e expandir a escala de vendas? Salinas – Nossa prioridade é consolidar as operações no Nordeste. Assim que colocarmos nossos pés na água, iremos avaliar a possibilidade futura de expansão.ISTOÉ – O sr. acredita num tratado de livre comércio entre o México e o Brasil? Salinas – Seria muito útil e é possível. Para isso, o Brasil precisa acabar com as barreiras não-alfandegárias que impedem a entrada de certos produtos mexicanos. ISTOÉ – A crise financeira nos Estados Unidos terá um impacto no México. Isso pode alterar seus negócios no Brasil? Salinas – Uma grande parte da culpa da crise no sistema bancário americano é que os grandes bancos se distanciaram muito dos seus clientes e de sua realidade econômica. Felizmente, nós não temos este problema. Mantemos contato muito próximo com nossos clientes. Continuamos muito comprometidos com o Brasil.[ADRIANA MATTOS E MILTON GAMEZ

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